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Cadê a cultura que ‘tava aqui?

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O grande maestro Tom Jobim, em suas divertidas tertúlias nas mesas do Leblon, dizia que um de seus sonhos de juventude seria realizar um filme sobre a história brasileira do séc. XX, na qual retrataria a batalha de Itararé da seguinte forma: de repente, a tela ficaria em branco e sem nenhum som, assim permanecendo por infindáveis 30 segundos. Na verve do maestro soberano, assim se faria a melhor representação do que seria o momento mais épico da Revolução de 30, quando as forças revolucionárias do Sul, comandadas por Getúlio Vargas, se defrontariam com as forças governistas de Washington Luís, no município de Itararé, SP. Mas a célebre batalha de Itararé, como se sabe, simplesmente não aconteceu: furou, deu cano, no entanto rendendo um título de barão ao humorista Aparício Torelly, que o exerceu muito bem, aliás.

Falar de Cultura nos tempos de agora é mais ou menos a mesma coisa. É falar sobre algo que não há e não se tem certeza de que possa haver. Vivemos o momento da Cultura de Itararé, a que não foi, nem é: trata-se, por enquanto, de uma conversação sobre o nada, para remeter ao título de uma obra musical contemporânea, de cujo autor não me lembro. Por enquanto, estamos falando mais de não-cultura que propriamente de Cultura. De concreto, pouco temos além das tradicionais manifestações de intolerância retaliatória, nas quais se anunciam cortes de verbas, extinção de órgãos, perseguição a artistas e pensadores e outras edificâncias que-tais. Fala-se que somente das empresas estatais cerca de 128 milhões de reais podem deixar de ser direcionados à Cultura. Mas, frise-se, não se trata de cortes: na novilíngua ora entronizada, são só “reavaliação das aplicações de recursos.” Outros engodos são divulgados impunemente nos tuítes da vida: foi dito, como pretexto para maior redução de verbas para a Cultura, que só a Caixa Econômica Federal teria gastado R$ 2,5 bilhões em patrocínio e publicidade em 2018, quando na realidade R$ 685 milhões é que tiveram tal destinação. E assim se está precarizando ainda mais o que já é precário, se vem pauperizando o que já é insuficiente para atender às demandas da área. Com isso, a desmontada Cultura brasileira vem se desmontando cada vez mais.

Mas talvez pior que essa derrocada material seja o desprezo institucional pela Cultura que a inépcia, a carência moral e o autoritarismo de alguns governantes vêm impondo à sociedade brasileira. Símbolo disso é a caça predatória à Lei Rouanet, levada à cabo por palpiteiros ignaros, com pouco ou nenhum conhecimento dos mecanismos de financiamento à Cultura. Hoje, artistas e empreendedores culturais vêm sendo genérica e massivamente demonizados como oportunistas que mamam nas tetas do Estado, como se nada de positivo houvesse nos modelos de financiamento cultural público. Claro que todos estes modelos podem – e devem – ser continuamente revistos e aprimorados, mas jamais extintos, principalmente para atender à argumentação farisaica dos que acham que os gastos com a Cultura são um desperdício e um pesado ônus para o país. Os incentivos à Cultura (existentes em todo o mundo, principalmente para as áreas do audiovisual e das artes performáticas), no Brasil não significam nada diante dos estratosféricos recursos que os governos transferem ao sistema financeiro e/ou às grandes corporações privadas, inclusive multinacionais, seja através de “financiamentos” diretos de recursos, seja por meio de concessões vantajosas para que atuem nos mercados, apropriando-se depois dos resultados obtidos. Mas isso, parece que ninguém vê…

As distorções no financiamento público à Cultura em geral derivam do concurso simultâneo de três agentes: dos próprios criadores e produtores culturais que buscam recursos do Estado para realizar empreendimentos de eficácia social, cultural e mercadológica duvidosa; dos “patrocinadores” e atravessadores privados, que se valem das leis de incentivo para usufruir do marketing mais barato que existe, o que é pago com dinheiro público; e dos maus agentes estatais, que se prevalecem de estar na posição concedente de guichê pagador para obter benefícios de variada ordem.

Pelo andar da carruagem, o governo recém-instalado parece disposto a seguir esse mesmo (des)caminho na gestão dos recursos para a Cultura. Mas ele vai além: erra feio ao conceber como Cultura apenas a perfumaria intelectual e artística, subjugando-se ao varejo cultural e ao consumismo desenfreado ditado pelas corporações que dominam a indústria criativa mundial, como se o país não pudesse (e devesse) ter uma pauta cultural própria; abdica de sua obrigação de defender a diversidade cultural nacional, assumida quando o Brasil firmou a Convenção da UNESCO pela Diversidade Cultural (2005), em lugar disso preferindo ser caudatário da massificação mercadológica imposta pelo mainstream cultural mundial. Mais grave que isso, o atual governo, não vê a Cultura como um dos itens fundamentais a um projeto de Nação. Como decorrência disso, tudo indica não haver interesse governamental em investir na infraestrutura cultural nem em bens de produção cultural nacionais, deixando lugar apenas para o imediatismo dos bens de consumo. Com raras exceções, estamos produzindo hoje apenas cosméticos e bugigangas culturais, esquecendo-nos da lição do grande Guimarães Rosa: “Não faça biscoitos, faça pirâmides.” Para atender à mediocrização cultural crescente, estamos perdendo espaço no rankingmundial da qualidade: nossa música popular, p. ex., antes tida como uma das três mais importantes do mundo, hoje está sumindo do mercado internacional, perdendo espaço para os sub-produtos made in Miami, made in Hong-Kongmade in Seoul ou coisa que o valha. A falta de vigor cultural explica por que nosso próprio mercado fonográfico interno, que foi o sexto do mundo até o início dos anos 80, hoje amarga a décima-quarta colocação mundial e ainda com viés de baixa, como dizem os economistas. E assim o Brasil está perdendo lugar no mundo não só em excelência cultural como também em termos econômicos, visto que, como se sabe, a Economia Criativa é hoje um item significativo no PIB de muitos países. No Brasil, até mesmo na crise atual, ela chegou a significar 2,64% do PIB… mas com viés de baixa, infelizmente.

A ironia de Jobim sobre Itararé diz muito sobre a Cultura (melhor dizendo, a não-cultura) dos tempos atuais. Mas como analogia das ameaças à Cultura e à Democracia no Brasil de hoje, são mais eloquentes dois outros episódios históricos: o discurso do general fascista Millán Astray contra o filósofo Miguel de Unamuno, em outubro de 1936, durante a Guerra Civil Espanhola, quando o primeiro gritou: “Abajo la inteligência, viva la muerte!”; e o desaforo do nunca assaz mal-lembrado Joseph Goebbels, o marqueteiro de Hitler, que dizia: “Quando ouço falar em cultura, tenho ganas de pegar minha pistola!”. Ao nazista reagiu certeiramente Millor Fernandes, que afirmou que preferia sacar sua cultura quando ouvia alguém falar em pistola.

É sintomático e preocupante que no Brasil atual também pareça se estar propondo, de novo, a opção entre inteligência e morte, entre cultura e pistola. Eis a marca desses novos tempos, que não podemos aceitar. Temos de resistir, recuperando a dignidade institucional da Cultura, reinserindo-a como parte fundamental de nosso projeto de Nação e lutando para que os mecanismos de sua proteção não fiquem em mãos dos que querem aviltá-la e controlá-la por meio do garrote orçamentário, da burocracia excessiva e da coerção sobre suas instituições. Por que querem fazer isso? A resposta está nas palavras de Jorge Coli, professor de história da arte na Unicamp: “A linguagem, a música, as artes, o conhecimento e a cultura são hoje violentados, ridicularizados, negligenciados, porque de fato são eles as grandes forças poderosas contra a barbárie.”

Abaixo a barbárie, pois. Façamos como Millor: contra a pistola de hoje, saquemos a Cultura de sempre.

* A conferência acima foi proferida pelo maestro Marcus Vinicius, da Fundação Instituto Cláudio Campos, na reunião do Observatório da Democracia que analisou os 100 dias do governo Bolsonaro. O Observatório da Democracia é composto pela Fundação João Mangabeira (PSB), Fundação Leonel Brizola-Alberto Pasqualini (PDT), Fundação Mauricio Grabois (PCdoB), Fundação Perseu Abramo (PT), Fundação Lauro Campos e Marielle Franco (PSOL), Fundação Instituto Claudio Campos (PPL) e Fundação da Ordem Social (PROS).

MARCUS VINICIUS DE ANDRADE*
 Por  Publicado em 15 de abril de 2019

 

 

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